A arte romana imperial: Classicismo e Ideologia

 Miguel Miguele de Sá

Friso  processional do Ara Pacis mostrando membros da família imperial. Retirado de: https://multarte.com.br/arte-romana/

  A Roma imperial começa em meados do ano 27 a.C., logo após a época da Roma republicana, e o Império Romano tornou-se, ao longo da história, um modelo para outros impérios futuros.  A arte romana é um referencial de apropriações para a construção de novas ideologias para a Idade Média, para as eras napoleônica e vitoriana, e até para nossa contemporaneidade. Mas, além de suas ideologias, o lado artístico também ficou conhecido trazendo uma visão realista e detalhista para as obras como pinturas e esculturas (por influência da arte etrusca) e uma visão da beleza ideal (por influência da arte grega), além da arquitetura famosa pelo emprego de arcos e colunas.


Água Alexandrina feito em Roma, Itália, tirada por Alessandro Vitalo Retirado de: pt.wiki.org/wiki/agua_alexandrina

  O Império Romano do Imperador Otávio ajustou a economia romana com o desenvolvimento da agricultura, e com a economia em alta, ele iniciou uma campanha de revitalização de Roma e de apoio aos artistas. Com isso, o império todo recebeu construções importantes como estradas e aquedutos. Um dos aquedutos mais famosos da Roma foi construído durante o império de Alexandre Severo, que é o Água Alexandrina, com ~22km de extensão.

  Um exemplo bem famoso da influência que o império romano teve no mundo é o Arco do Triunfo de Napoleão. Com 50 metros de altura e uma base de 45 por 22 metros, o Arco do Triunfo representa as vitórias do exército francês sob ordens de Napoleão, o que era muito comum em Roma, como podemos ver no Arco de Triunfo de Constantino. Observando ambos lado a lado é possível reparar nas semelhanças.

Arco do Triunfo de Constantino localizado em Roma, Itália, ao lado do Coliseu. Composto por 3 arcos, ele possui 21m de altura e 25m de largura. Retirado de: https://www.romapravoce.com/arco-de-constantino-roma/


Arco do Triunfo de Napoleão localizado em Paris, França. Retirado de: https://www.tudosobreparis.com/arco-triunfo

  Era um momento de paz e prosperidade que foi chamado de Pax Romana (Paz Romana, em latim). Roma estava focada em manter a mesma identidade em todas suas regiões conquistadas. Além disso, o império também fazia tudo para poder manter esta paz: soldados eram posicionados em lugares que podiam causar rebeliões, ou principalmente em fronteiras, para evitar invasões. Entretanto, como o próprio conceito de império sugere, Roma mantinha a paz através do medo, impondo uma monarquia absoluta. O objetivo era estabelecer estabilidade política por meio de um regime ditatorial.

  Roma, após conquistar a Grécia, se impressionou com sua arte e certos costumes que então adquiriu para si, sendo que em muitas obras romanas podemos ver características gregas, de forma que há muito da arte grega clássica dentro do império romano, que cresceu a partir de suas instituições sociais, valores, atitudes e princípios artísticos fundamentais, que assim fez surgir a conhecida Era Clássica. O clássico, então, se tornou a forma artística de expressão da Roma Imperial, e que acabou dando um impulso a este movimento quando Roma virou um exemplo para aqueles outros que aspiravam ter um império e que então se inspiravam na forma clássica para se espelhar ao império romano.

  Podemos ver isto na obra de Policleto, Diadoumenos, provavelmente uma cópia romana da arte original grega.     

Estatua de Policleto, Diadoumenos, 
provavelmente uma copia romana 
da arte original grega.
  A estátua foi encontrada em uma casa de Delos, um santuário grego e um grande porto controlado por Atenas depois de 167 a.C., durante o primeiro estágio do domínio romano sob o Mediterrâneo oriental, e tem como significado “Jovem amarrado a sua rede”. A obra apresenta diversas características clássicas, como a idealização do corpo humano, com o perfeito equilíbrio entre expressão, proporção e movimento. A obra ganha maior realismo e dinamismo procurando refletir a perfeição da forma e beleza humana. A estátua foi, originalmente, atribuída ao artista grego Policleto, o qual desenvolveu um sistema matemático do corpo humano, com o objetivo de passar a perfeição e eternidade de tal. Os romanos se apropriam dessas características da expressão artística grega justamente pela sua visão de eternidade, racionalismo e robustez, que eram valores que eles queriam ver incorporados ao seu império.

  A arte romana imperial apresenta muito da sociedade da época, ou seja, toda obra apresenta uma ligação ao poder. Era adotada uma propaganda para que tanto o povo romano como aqueles que vindos de outras partes do mundo pudessem ter esta imagem de uma Roma poderosa, que trouxe prosperidade, uma Roma vitoriosa em suas batalhas, ou também imagens retratando os imperadores sempre musculosos e jovens, oferecendo esta visão de uma juventude infinita e perfeita.

  Para os romanos, a nudez era algo inadmissível no meio público, principalmente para cidadãos respeitáveis de Roma. Ficar nu em público era algo só aceitável para escravos, entretanto com o império romano os banhos públicos começaram a ficar mais populares, o que começou a dar, gradativamente, uma visão mais aceitável do nu, mas ainda sim não se podia andar nas ruas sem roupa. Quando Roma começou a usar os modelos artísticos gregos, a nudez escultórica começou a ser mais frequente, mas esta nudez, vista em obras de arte, tinha um sentido extremamente oposto ao nu público, que representava vulnerabilidade; a nudez em obras artísticas, ao contrário, representava um status de herói para aquele que era representado. O objetivo do corpo vestido e despido na arte romana imperial é trazer o corpo como algo que remete a visão política, social e até artística do mesmo; sua modelagem dependia, assim, dos ideais e do status que se desejava atribuir à pessoa representada.

Cena da vida de Íxion, Casa dos Vécios. Retirado de: pt.wikipedia.org/wiki/Pintura_da_roma_antiga
  
    A nudez e a representação heroica nas obras era um símbolo de vigor, carisma e masculinidade. Era importante que os soldados tivessem uma relação especial com seus líderes, com uma nítida identidade dos seus líderes, principalmente do imperador. O corpo é um dos meios mais importantes de evidenciar a relação do homem com o mundo. Se juntarmos os gestos, posturas, vestes e até a nudez, a obra tem uma visão mais dinâmica, quase como se as obras tivessem vida. Então, Augusto, como qualquer pessoa, começou a envelhecer, mas não em seus retratos, em que ele sempre mantinha uma feição jovial e forte, o que acabou influenciando as próximas gerações  deste império que retratava seus líderes de forma artística pela sua imagem imperial. A semelhança artística não significava nada; as obras não eram focadas na aparência mas sim o que o imperador representava para seu império, o que geralmente era poder e força, juntamente a visão de juventude infinita. Como na obra Cena da vida de Íxion, Casa dos Vécios.

  A arte romana imperial se focava em três tipos de propaganda: a vitória militar com sua instauração de poder sob os inimigos; a paz alcançada através de sua vitória na Guerra Civil, que trouxe a Pax Romana já comentada; e a alegação de sua decência divina, sendo filho do deus César e descendente direto de Eneias, filho de Vênus. Então “vitória, paz, prosperidade e descendência divina” é a retratação mais fiel, das propagandas do Império romano  (KLEINER, 1992, p. 63).

 
Escultura de Augusto de Primaporta
Retirado de:
 pt.wikipedia.org/augusto_primaporta

Uma obra em que podemos ver estes aspectos é a escultura de Augusto de Primaporta, esculpida em mármore branco, com 2,7 m de altura e pesando 350 kg. Augusto veste uma couraça militar, mostrando que ele além de imperador é também chefe do exército; esta couraça é extremamente detalhada com uma decoração que faz alegoria aos deuses e heróis, figuras que mostram povos e regiões que já foram conquistadas, para mostrar o  poder e a força dele. 

Abaixo dele há uma figura do cupido sentado em um golfinho para representar seus supostos descendentes divinos: deus César, sendo filho do mesmo e Eneias, filho de Vênus

Com rosto e fisionomia juvenil, a escultura o mostra erguendo o braço direito em um gesto de fazer um discurso ou dar uma ordem, mostrando sua imponência e completando o conjunto inteiro que representa um líder jovem, conquistador, sereno, firme e divino. Um líder seguro de suas ações, ideais e palavras.

Esta imagem idealizada do Augusto foi encomendada por sua esposa Lívia, após sua morte, como uma maneira de imortalizar ele e a sua visão da romanidade.

Uma curiosidade é que é possível ver na escultura requisitos de tinta dourada, púrpura e azul, demonstrando que, originalmente, a estátua era policromada.



Fontes:

  • FULLERTON, Mark - Arte Grega.
  • VENTURA, Gilvan - Política,  Ideologia e Arte Poética em Roma: Horácio e a Criação do Principado
  • FERNANDES, Mayara - Poder, Corpo e Mito no Retrato Romano da época de Augusto
  • AIDAR, Laura - Arte Romana. Toda Matéria. Disponível em: https://www.todamateria.com.br/arte-romana/
  • Roma antiga: A arte como propaganda do poder imperial. Ensinar História. Disponível: https://ensinarhistoriajoelza.com.br/roma-antiga-arte-como-propaganda/ 
  • A experiência imperialista romana: teorias e práticas. Scielo. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-77042005000100002
  • SOARES, Átila - As origens da identidade romana. Oriundi. Disponível em: https://www.oriundi.net/as-origens-da-identidade-romana
  • SILVA, Daniel Neves. Império Romano. Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/historiag/imperio-romano.htm 
  • SILVA, Daniel Neves - Pax Romana. Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/historiag/pax-romana.htm 
  • Arco de Constantino. Tudo sobre Roma. Disponível em: https://www.tudosobreroma.com/arco-constantino 


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