Parthenon e os valores gregos por Larissa Fagundes Leonardi e Julianne Agge Auffinger.
A história do Parthenon
O Parthenon foi erguido para substituir um templo construído anteriormente e destruído pelos persas. O templo novo foi construído entre 447 e 432 a.C., após Atenas derrotar a invasão persa. Considerado um dos pontos altos do estilo clássico grego, o templo tinha como um dos principais objetivos celebrar a vitória dos gregos sobre os persas. Sua construção se deu sobre a iniciativa de Péricles e foi dedicado a Deusa Atena Partenos (Atena virgem); erguê-lo só foi possível com os fundos obtidos através da liga de Delos, que foi a união entre cidades-estados gregas da região da Ática. As disputas entre as cidades-membro da Liga fizeram com que Atenas se sobressaísse como um verdadeiro império. Assim foi fácil para Péricles mover todo o fundo da liga para cidade de Atenas e consequentemente usufruí-lo para construção do grande Parthenon, alegando que assim os fundos estariam a salvo da ameaça persa.
![]() |
Fig. 1. Parthenon. Foto: Steve Swayne, wikipedia, 1978. |
A construção do templo
A construção do templo, além de ornamentar a cidade, também era uma maneira de agregar toda uma série de atividades econômicas ao entorno. Por ser uma construção grandiosa esperava-se que trouxesse crescimento econômico à Pólis.
O Parthenon pretendia ser o grande monumento dedicado aos valores gregos. O templo é em estilo dórico, porém, com alguns elementos jônicos. O arquiteto responsável pela construção foi Ictino, assistido por Calícrates, que era especialista na ordem jônica.
Esta fusão de formas dóricas e jônicas no Parthenon teve sem dúvida a intenção de expressar uma das qualidades da Atenas de Péricles. Ao nível mundano, ela lembrava o fato de que, mesmo que situada no continente essencialmente dórico, Atenas reclamava o parentesco com os jônicos das Cíclades e da Ásia Menor, e a base do seu poder recém-adquirido residia em grande parte nestas áreas. E, em um nível mais idealista, era a convicção de Péricles, enunciada na Oração Fúnebre, que Atenas tinha conseguido “cultivar o refinamento sem extravagância e o conhecimento sem indolência.” (Tucídides, II. 40). A ordem jônica trazia à mente o luxo, o refinamento e o intelectualismo da Jônia; o dórico era associado com a simplicidade melancólica, impassível dos descendentes de Héracles no Peloponeso. Em um tempo que encarnava Atenas, era natural que Péricles desejasse que os dois estivessem em harmonia. (POLLIT, 1978, p. 15)
![]() |
Fig. 2 - Exemplo de estilo de arquitetura dórica. Disponível em : http://www.historiadasartes.com/nomundo/arte-na-antiguidade/arte-grega/#jp-carousel-998
Simbolicamente, o Parthenon representava aspectos essenciais da cultura e sociedade gregas. O templo era um local de reunião e de veneração dos valores essenciais do pensamento grego. Para eles, um templo como o Parthenon não era apenas belo e impressionante, mas também um símbolo de todos os valores essenciais que mantinha unida a sua perfeita civilização.
A escolha de Atena como símbolo e escultura principal do templo (fig.3) tem bastante relação com ela ser a padroeira da cidade. Levando em consideração toda a mitologia grega, lembraremos que a Deusa Atena venceu a disputa com o Deus Poseidon pelo patronato da cidade de Atenas e para isso estabeleceram um concurso: quem desse o melhor presente à cidade ganharia. Poseidon bateu com seu tridente e fez jorrar água do mar e também fez aparecer um cavalo. Já Atena, além de domar o cavalo e torná-lo um animal doméstico, também deu como presente uma oliveira que produzia alimento, óleo e madeira, assim vencendo, de forma que a cidade levou seu nome, Atenas. Além disso, a obra carregava outros símbolos da mitologia e a base que carregava a estátua era adornada com um relevo mostrando o nascimento de Pandora. Todos os símbolos e representações em Atenas significam a celebração da sua coragem e imponência o que revela o simbolismo aliado a esta obra e aos valores gregos representando a cidade de Atenas como uma grande potência guerreira, corajosa e forte.
Toda a arquitetura do templo foi pensada para valorizar ao máximo o local onde a escultura de Atena estava (fig.3) . Além disso o simbolismo usado nos conjuntos escultóricos remete também à supremacia do mundo grego e de Atenas. O uso de colunas dóricas e jônicas, o entalhamento de cada peça como uma joia demonstra que ali encontrava-se um templo único. Alia-se a este conjunto todos os cálculos matemáticos usados na colocação das colunas, com proporções arquitetônicas e distorções óticas objetivando dar ao templo a aparência de ser maior do que realmente era; consequentemente todo este conjunto tinha o ar de imponência desejado por Péricles.
Fig. 3. Ilustração com elementos arquitetônicos, esculturas e movimentação do Parthenon. Fonte: http://felixrubioblog.blogspot.com/2013/08/el-partenon.html
Fig. 4. Réplica da estátua da Atena Parthenon em Nashville, de Alan Le Quire, imagem da wikimedia commons. foto: Dean Dixon (apud https://blog.britishmuseum.org/an-introduction-to-the-parthenon-and-its-sculptures/?_ga=2.105620739.1009515932.1533430488-296175262.1533430488)
Fig. 05. Planta baixa e distribuição dos relevos.
Legenda dos sinais da fig. 05
Frontões
A (oeste), disputa entre Atena e Posídon
B (leste), nascimento de Atena
Métopas
a (oeste), amazonomaquia
b (norte), destruição de Troia
c (leste), gigantomaquia
d (sul), centauromaquia
Frisos
1 cavaleiros
2, cavaleiros
3, carruagens
4, velhos, músicos, carregadores de oferendas e de animais para o sacrifício
5, mulheres
6, heróis epônimos
7, deuses
X, entrega do peplo
Conjunto escultórico do Parthenon
O conjunto escultórico do Parthenon tem uma significância ímpar, principalmente se atrelado a todo conjunto da obra, em que coexistem a arquitetura e o grupo de esculturas. Para executá-los, além de seu escultor principal Fídias (responsável pela grandiosa obra de Atenas), foi necessário um exército de escultores, todos devidamente orientados e supervisionados por Fídias, contribuindo muito para o que depois viria a ser conhecido como o estilo Alto Clássico Grego. Estas obras estavam por todo o Partenon: no frontão, nas métopas, no friso lateral e no friso oeste.
As métopas
As métopas são os espaços existentes entre dois tríglifos de um friso dórico. (fig.6)
Fig 3. Capitel e entablamento dórico, e métopas oeste - Wikimedia Communs
As métopas do Parthenon somavam um total de 92, mas por conta da destruição não temos acesso à imagem e às histórias narradas em todas. Sabemos que as métopas utilizavam-se de mitos, arquétipos e lendas para representar o triunfo das forças da ordem sobre o caos e a barbárie. Nas métopas do lado sul estão representadas a Centauromaquia, cenas de Lápitas lutando com centauros, com os gregos vencendo as figuras mitológicas, demonstrando a supremacia do povo grego (fig 7, fig 8).
Fig. 7 - Parthenon, métopa sul XXXI, c. 447-442 a.C. Disponível em: https://classconnection.s3.amazonaws.com/910/flashcards/6044910/jpg/8_pc_35694_10101-148AAFB8E0A6A2A3B31.jpg
Fig. 8 - Parthenon, métopa sul XXVII, c. 447-442 a.C. Disponível em: http://www.ancient.eu/uploads/images/3310.jpg?v=1431033257
As métopas no leste retratavam a Gigantomaquia, a batalha dos deuses contra os gigantes nascidos da terra que tentavam atacar o Monte Olimpo. Nesta representação, além da luta de deuses contra humanos, podemos notar que a obra já tem mais detalhes, com a leveza do manto e as curvas mais acentuadas. Começava a aparecer aqui um indício do que viria a ser o Alto Clássico Grego, que depois viria a influenciar Roma e consequentemente o Renascimento.
As métopas do oeste parecem ter apresentado um conflito (ou conflitos) entre gregos e amazonas; temos registros delas somente através de relatos e não em imagens.
Os frisos
Os frisos do Parthenon, que formavam uma faixa de 1,04 metros de altura e cerca de 160 metros, apresentam apenas o tema de uma Panatenéia (procissão em honra de Atena). Esses frisos se iniciam no lado oeste do templo, correndo na direção oriental em correntes paralelas ao longo dos lados sul e norte, e culminando acima da entrada para o Naos. O evento retratado nestes frisos tinha bastante importância para o povo grego. Segundo relatos a Panatenéia era uma procissão e também um festival em honra de Atenas, que envolvia jogos, cavalgadas e rituais. O interessante nessa representação é que, diferente das métopas e do frontão em que são retratados deuses e figuras mitológicas, pela primeira vez os gregos estão retratando um evento real, com figuras não da mitologia mas sim do cotidiano. O estilo de esculturas usadas no friso é mais homogêneo do que nas métopas e frontões.
A Oração Fúnebre de Péricles retratou a sociedade ateniense com qualidades divinas, e talvez o friso do Parthenon, onde a brecha visível e espiritual entre homens e deuses desaparece, teve a intenção de transmitir a mesma visão. Talvez vejamos os cidadãos de Atenas Pericléia tornados apoteóticos (POLLIT, p. 23)
Fig. 10 - Parthenon, friso norte, laje XLII. Fonte: Wikimedia Commons.
Fig. 11 - Parthenon, friso oeste. Fonte: Wikimedia Commons.
Fig. 14 - Parthenon, friso sul. Disponível em: https://www.flickr.com/photos/20302464@N07/6967238878
Fig. 15. Alguns dos frisos do Parthenon no British Museum disponível em : https://www.apaixonadosporhistoria.com.br/artigo/205/introducao-a-arquitetura-na-grecia-antiga#lg=1&slide=0
Os frontões
Os grupos escultóricos do frontão sofreram com uma grande explosão em 1687. Por conta disso, o que sabemos das esculturas que ali ficavam são descrições feitas como por Pausânias, por exemplo, que disse que o grupo a leste representava o nascimento de Atenas, e a oeste a luta entre Atenas e Poseidon pela soberania de Atenas. Apenas um elemento de cada grupo ainda está no lugar original do edifício. Mas é possível se ter uma ideia de como era o grupamento através de um desenho feito em 1647 atribuído a Jacques Carrey. (fig 16, fig 17, fig 18, fig 19)
Fig. 16. Desenho atribuído a Jacques Carrey de 1647, frontão oeste parte norte, disponível em : https://www.wikiwand.com/en/Pediments_of_the_Parthenon
Fig. 18. Desenho atribuído a Jacques Carrey de 1647, frontão leste parte sul disponível em : https://www.wikiwand.com/en/Pediments_of_the_Parthenon
Fig. 19. Desenho atribuído a Jacques Carrey de 1647, frontão leste parte norte, disponível em : https://www.wikiwand.com/en/Pediments_of_the_Parthenon
Fig. 20. Reconstituição moderna do frontão oeste e leste do Parthenon a partir de uma proposta de K. Schwerzek, Museu da Acrópole de Atenas. Disponível em :http://www.ipernity.com/doc/26252/47701052
Fig. 21. Parthenon, pedimento oeste, figuras "K", "L" e "M", provavelmente Héstia, Dione e Afrodite. Comprimento de "L" E "M" c. 2,34 m. Disponível em wikimedia commons
Conclusão
O Parthenon inaugurou uma nova era na sociedade grega, em que valores e pensamentos se moldaram juntamente com a arte e sua arquitetura; o refinamento e grandiosidade das obras ali expostas estavam em completa sintonia com o caráter de seu povo. A deusa Atena como a detentora do poder e vencedora diante de todos os acontecimentos, assim como Atenas venceu os persas e triunfou.
Atenas se consagrou como Pólis e não apenas como um agrupamento geográfico. A sociedade moldou seus valores e se sustentou pela história ali contada, aliando as histórias contadas nos conjuntos escultóricos do frontão, frisos e métopas com arquétipos mitológicos que retratavam o grande triunfo dos deuses e crenças religiosas e humanas como a Panatenéia.
O templo não é só um templo, é o resumo de toda a história de uma sociedade em desenvolvimento que tem suas crenças, mas que está cheia de vitórias e de motivos para comemorar. Sua imponência arquitetônica demonstra potência e tem um grande significado dentro da história grega.
Muito se pode aprender sobre o arte clássica grega olhando-se para o Parthenon. Ele nos transporta para os estilos arquitetônicos com suas colunas meticulosamente calculadas. Demonstra as expressões da arte clássica no relevo, semi-relevo e nas esculturas, com habilidade de retratar músculos, corpos definidos, perspectivas e a leveza dos mantos; além disso, nos remete à possibilidades do humano com a representação da Panatenéia nos frisos, mostrando as divindades nas métopas e frontões.
REFERÊNCIAS
ALMONFREY, Juliana de Souza Silva. História da arte I [recurso eletrônico] / Juliana de S. Silva Almonfrey. - Dados eletrônicos. - Vitória : Universidade Federal do Espírito Santo, Secretaria de Ensino a Distância, 2018.
FULLERTON, Mark D. Arte Grega. Trad. Cecília Prada. São Paulo: Odysseus, 2002.
GRÉCIA quer resgatar de Londres as esculturas do Pártenon. National Geographic, 2020. Disponível em: < https://nationalgeographic.sapo.pt/historia/grandes-reportagens/1107-grecia-quer-resgatar-de-londres-as-esculturas-do-partenon >. Acesso em: 08/10/2020.
GOMBRICH, Ernst. A História da Arte. Rio de Janeiro, LTC, 1999
IMBROISI, Margaret; MARTINS, Simone. Arte Grega. História das Artes, 2020. Disponível em: <http://www.historiadasartes.com/nomundo/arte-na-antiguidade/arte-grega/>. Acesso em: 09/10/2020.
POLLIT, Jerome Jordan. O mundo sob controle – o momento clássico, c. 450-430 a.C. Trad. Fabricio Vaz Nunes. In: _____. Art and experience in Classical Greece. Cambridge: Cambridge University Press, 1972.
Comentários
Postar um comentário